O livro do jornalista Ali Kamel, publicado pela Nova Fronteira, é tão esclarecedor sobre o islamismo quanto polêmico nas teses que defende. Esclarecedor e, mais do que isso, necessário aos dias de hoje, quando se dispõe a mostrar os vínculos profundos entre a religião de Maomé e as de Moisés e Jesus; quando, por exemplo, repavimenta o trajeto que liga o grande profeta do islâmismo à Ismael, filho de Abraão com sua escrava Agar, concebido com a conivência de sua esposa Sara. É esclarecedor também quando trata das disputas entre os seguidores de Maomé após sua morte e do contencioso em relação ao papel de seu primo Ali, que redundaria na eterna batalha entre Sunitas e Xiitas.
Exige suspicácia, porém, o encaminhamento do autor sobre a indiferença entre o Islã e as "Religiões do Livro" quanto à belicosidade dos fiéis por ispiração divina. Se tanto o deus dos cristãos e judeus quanto Alá pregaram, em momentos devidos, o combate sangrento ao inimigo circunstancial, parece que o desenvolvimento das sociedades sob o Judaísmo e sobre o Cristianismo permitiu uma ampliação da laicidade incomparavelmente maior do que a que se verifica nas sociedades muçulmanas. Talvez venha daí a maior dificuldade de contenção da violência inspirada por deus no islamismo: não de seu monopólio da barbárie com justificação divina, porque não há monopólio, mas da maior presença de aspectos religiosos em questões que são do âmbito racional e laico, como a organização social e política e as relações internacionais.
Não se trata de ignorar as diferenças entre os extremistas e os demais religiosos quanto à disposição para o terrorismo, mas, de alguma forma, entendo o extremismo como degeneração da qual qualquer religião original não pode simplesmente se isentar. Atribuir a violência a esse ou aquele grupo de religiosos radicais não resolve o problema e nem deve absolver as religiões que, ao longo da História exacerbaram seu papel institucionalizando-se de si para si.
O livro de Ali Kamel torna-se realmente problemático, quando o autor se aventura na intrépida tarefa de defender a invasão americana do Iraque. Nesse ponto, a partir da página 237 exatamente, o jornalista elenca uma porção de minúsculos e frágeis argumentos para negar o unilateralismo da ação americana, para desculpar o equívoco sincero de George W. Bush quanto às armas de destruição em massa que Sadam não tinha e para justificar a redução das liberdades civis nos EUA, entre outras coisas. Kamel chega a detectar ingratidão por parte dos países europeus que desampararam os EUA na guerra contra o Iraque, sendo que tanto nas duas grandes Guerras quanto na Guerra Fria puderam contar com o apoio americano.
De todo modo Sobre o Islã - afinidade entre muçulmanos, judeus e cristãos e as origens do terrorismo é um livro que merece ser lido, mesmo que seja para discordar.
segunda-feira, 24 de setembro de 2007
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