segunda-feira, 24 de setembro de 2007

A Interpretação do Assassinato

Atualmente você poderá encontrar nas gôndolas destacadas de qualquer grande livraria o romance A Interpretação do Assassinato, do americano Jef Rubenfeld, lançado pela Cia das Letras. Encontrá-lo em posição privilegiada na livraria, como você deve saber, não é necessariamente mérito do livro, é antes da editora e de seu relacionamento comercial com a livraria, mas tampouco o editor costuma gastar vela com mau defunto. Talvez o livro de Rubenfeld não seja mesmo um mau defunto, afinal traz impressas em sua portada duas informações importantes que funcionam como armas potentes na guerra tribal que é o mercado editorial brasileiro: "800 mil livros vendidos no exterior" e "Crimes misteriosos ameaçam Nova York durante a visita de Freud aos Estados Unidos". Quanto à primeira chamada, não há muito o que dizer; sem referências, sem inquitações conscientes, encurralado entre o pragmatismo e o entretenimento, o grande público leitor rende-se ao velho sistema de agendamento espiralado: muita gente leu, muita gente fala, eu leio, eu falo, mais gente lê, mais gente... nesse sentido, com quase um milhão leitores e ainda estrangeiros, o livro é realmente promissor.
A segunda chamada, porém, é que suscita reflexão mais profunda. Impossível pensar essa publicação sem lembrar do êxito editorial rescente de "Quando Nitzsche Chorou" e "A Cura de Shopenhauer", entre outros. Simples "tendência" do mercado editorial: Breuer, Nitzsche, Freud, Shopenhauer, Jung e Ferenczi, como personagens de romances de fácil leitura? Talvez, embora o termo "tendência", para mim, nunca tenha esclarecido nada, a não ser a constatação do fenômeno e a indisposição para se refletir a respeito. Tenho a impressão de que, na verdade, estamos agora somatizando os traumas sofridos na infância, nos primórdios da nossa relação com as letras e com a ciência. Infelizmente a geração que consome, lê e manda não foi preparada para o desfrute estético que a literatura pode ofertar, nem tampouco foi provocada em sua curiosidade científica sobre o próprio homem e suas possibilidades. Resulta disso uma relação com os livros, quando há, que não é nem estética, nem científica e nem muito funcional, talvez no máximo uma forma respeitada de matar tempo e, quem sabe, possível de ser capitalizada socialmente.
De volta à Interpretação do Assassinato, devo dizer que como defunto, pode ser bom, mas, como livro, é bem ruim. A trama é quase infantil, lembra um pouco os desenhos do Scooby-Doo. O texto não obriga o leitor ao dicionário mais do que duas vezes. Os personagens, com uma ou outra excessão, são feitos de uma casquinha muito fina e os diálogos, que poderiam fazer a diferença, já que, segundo o autor estão baseados em muita pesquisa sobre a real visita de Freud e Jung aos EUA, são didáticos em nível primário. Não é literatura, nem Psicanálise, nem História, mas 800 mil livros já foram vendidos no exterior.

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