quarta-feira, 18 de maio de 2011

Filho pródigo



Era uma vez o melhor dos sonhos. Era o melhor porque além de perfeito, parecia tão real que ninguém diria que era sonho. Nasceu numa quinta-feira encantada, todos os sonhos nascem em algum momento encantado, mas só o melhor deles nasce numa quinta feira. Tê-lo em minha manjedoura era o maior dos privilégios. Tornei-me devoto dele. Bem nutrido, o melhor dos sonhos cresceu com vitalidade, ficaram no seu rosto, é claro, algumas cicatrizes da infância. Assumi minhas responsabilidades e me penitenciei pelos equívocos na criação.
O melhor dos sonhos, na meninice, continuou inquieto e inquietante, ganhou, por isso, novas cicatrizes. Eu seguia orgulhoso, responsável e penitente.
Na adolescência, o melhor dos sonhos se expandiu, ganhou o mundo e adiquiriu postura. Perdi qualquer controle sobre ele, aliás, deixei que me ensinasse, me ensinou. Foram dias incríveis!
Ele já era adulto quando me convenceu de que minha vida estava errada e de que era a hora de seguir o caminho que ele me mostrava. Embora já seguisse, entendi, e arrisquei mais; ele estava certo! Era mesmo o melhor dos caminhos e vi, finalmente, a lindeza da vida pelo seu prisma. Já não sabia mais o que via se ele não me dissesse.
Um dia, faz pouco, o melhor dos sonhos simplesmente foi embora. Não deixou nem mesmo uma carta ou mensagem, simplesmente foi. Deixou-se diluir no universo.
Talvez volte, talvez não. Talvez volte irreconhecível, talvez não. Mas fico tentando ver na cara de cada sonho que passa se ele não é o melhor deles. Vejo que não. E não paro de me perguntar: "onde foi que eu errei com esse menino?".
Desnecessário dizer que, ao filho pródigo, a casa estará sempre aberta.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Osbama: "now, we really can"


Preciso dizer aqui algumas coisas que tenho dito por aí sobre o fim do duelo entre Osama e Obama.

1. Morreu mesmo o primeiro. Não tenho dúvidas, mesmo que o corpo não bóie. Parto do princípio que se o presidente dos EUA falou de madrugada que morreu, então morreu. Não que seja devoto, longe disso, simplesmente sei, mais ou menos, o que está em jogo. Americanos toleram, às vezes gostam, de presidentes canalhas, mas não suportam canalhas mentirosos. É assim desde George e nem Bush saiu impune. Disse que havia armas de destruição em massa e invadiu. Não havia, mentiu. Renovou com isso o espírito democrático do povo que, sim, podia e Obama se elegeu, não pode mentir.
2. Não capituraram e julguram, porque não. A encarnação do mal não precisa de julgamento. Tem que ser muito politicamente correto para sair em defesa de tratamento humanitário ao Diabo. Claro que não creio em diabos (seria muito desvantajoso para quem não cre em deuses), mas Osama caprichou em suas maldades. Além disso, quando já era mau, foi amigo de seus atuais inimigos. Ninguém gostaria de ouvir o que ex-amigos, agora inimigos, tem a dizer a nosso respeito.
3. Tem coisas que até podem ser explicadas pelo seu conteúdo, mas não pela sua forma. Tenho ideia do que soldados de qualquer época podem fazer quando capituram um inimigo, ou para capiturar um. Mostrar isso pode obscurecer o brilho da façanha e não o contrário. Melhor deixar a coisa por conta da imaginação da mídia e só alimentar com alguns detalhes que não permitem desvendar o enrredo. A mídia agradece e a informação perde, como quase sempre, para o entretenimento.
Isso é só mais uma hipótese para a falta de transparência do caso.
4. Não acredito em nova onda de terrorismo. Talvez um ou outro homem bomba. Obama sabe melhor do que eu: com uma década de pesados investimentos militares em tecnologia de combate ao terrorismo; com o retrocesso dos direitos civis pelo mundo (ligações gravadas e correspondências violadas); com quase todos os países que poderiam servir de QG para o terrorismo de grande escala "dominados"; com o Oriente Médio gostando de democracia; com o desprestígio atual da Al Qaeda, que chegou a ser festejada por intelectuais e gente boa equivocados... as nações estão hoje mais preparadas para terrorismo do que estavam no 11 de Setembro.
5. Ao chamar para sí a responsabilidade pela morte de Osama, Obama quis marcar seu protagonismo no fim e não no começo de uma temporada de terrorismo. Caso contrário seria cabo eleitoral de um republicano no ano que vem. Ninguém se convenceria de que o bom Obama pode ser mais durão do que um texas ranger para lidar com essa gente.
6. Com isso está posto o argumento da campanha democrata que veremos: now, we really can. "Se não cumpri ainda com as expectativas do povo americano, é porque tínhamos a 'herança maldita' do terrorismo para adiministrar. Agora que matei a praga, posso trabalhar, como sei, sabendo que minha gente está segura. Votem em mim".

sábado, 7 de maio de 2011

Fingindo Valentia



Às vezes perdemos algumas batalhas nas nossas guerras particulares contra a infelicidade: amores sólidos desmancham-se nos ares; contratos meticulosos de amizade são revogados por leis maiores; desonestos são recompensados onde a vaia é inútil; celebrações arquitetadas se revelam sacrificantes ao celebrado; o crédito não é suficiente nem para aquilo que não devia apelar ao crédito; é negativa a resposta do cliente que ainda não era cliente; falta o álcool sem que o delírio necessário esteja completo; o carro não pega nem com a ajuda dos vizinhos; a lâmpada do banheiro está mesmo queimada; embolorou a última desejada fatia de bolo da geladeira; o compromisso do dia seguinte é antes do que se imaginava; as palavras não expressam suficientemente os urgentes pensamentos; a solidão do momento obscurece a ilustração do combatente.
Cada uma delas é apenas uma simples batalha perdida. Cada uma com sua importância relativa, mas, como dizem: nenhuma é a derrota definitiva. Não vence por isso o inimigo.
Só que às vezes todas essas batalhas se dão ao mesmo tempo. E às vezes todas essas derrotas vem ao mesmo tempo. Nesse caso, como não conceder em depor as armas? Como não se render à tristeza?
Fingindo valentia! Talvez isso confunda o inimigo.A guerra contra a infelicidade às vezes é guerra de guerrilha! Começa parecendo perdida.